'A justiça por Carol foi feita', diz mãe de jovem morta no MA sobre condenação de acusado; vítima teve pele do rosto, couro cabeludo e olhos arrancados
Ana Caroline Sousa Campelo, de 21 anos, foi morta em dezembro de 2023 no Maranhão. Reprodução/TV Mirante “Foi difícil, muito difícil estar naquele tribun...
Ana Caroline Sousa Campelo, de 21 anos, foi morta em dezembro de 2023 no Maranhão. Reprodução/TV Mirante “Foi difícil, muito difícil estar naquele tribunal, sabendo que a gente ia ficar cara a cara com um bandido, que foi assassino de uma pessoa que a gente ama”, relatou Carmelita Silva Sousa, mãe de Ana Caroline Sousa Campelo, morta em dezembro de 2023 no Maranhão. A jovem teve a pele do rosto, o couro cabeludo e os olhos arrancados. Carmelita acompanhou nesta quarta-feira (5), em Governador Nunes Freire, o julgamento de Elizeu Carvalho de Castro, conhecido como “Baiano”, condenado a 27 anos e oito meses de prisão pelo feminicídio de sua filha. Para a mãe, a decisão do júri trouxe uma sensação de justiça, mesmo sem ser a pena máxima. “Foi muita aflição, muito nervosismo, mas a sensação de justiça a gente teve. A família ficou nervosa, aflita, ansiosa, esperando o resultado, o que ia acontecer, quantos anos ia ter o acusado. Foi muito difícil para nós. Mas teve a sensação de resultado final. 27 anos e 8 meses não é uma pena máxima, foi uma coisa que a gente não esperava, mas a gente teve que aceitar. A justiça por Carol foi feita”, disse Carmelita em entrevista ao g1. 📲 Clique aqui e se inscreva no canal do g1 Maranhão no WhatsApp Durante o julgamento, segundo ela, o réu negou o crime, mas as testemunhas foram firmes ao apontá-lo como responsável pela morte. “Fiquei cara a cara com ele. Ele não chegou a confessar, não disse que matou. Negou algumas partes, mas confirmou outras, como o fato de andar na moto, exatamente como mostrava o vídeo, e sobre a negociação da moto. Mas nunca admitiu ter matado ela por raiva ou algo assim. As testemunhas, todas, foram firmes. Não houve dúvida das testemunhas, todas falaram a verdade sobre o que viram e ouviram”, contou. Carmelita acredita que a condenação também foi resultado da mobilização popular que o caso gerou. “Eu lutarei sempre por ela, sempre que for preciso eu lutarei. Mas foi bom saber que ele foi condenado, graças ao mundo inteiro que se mobilizou pelo acontecido e ajudou a acusar esse marginal, para ir ao Tribunal de Justiça para ser julgado pelo que ele fez. E eu tô feliz por esse júri ter acontecido”, afirmou. Emocionada, a mãe relembrou os momentos que viveu com a filha, a quem chama de “tesouro”. “As lembranças vão ficar guardadas no meu coração. As lembranças que tenho dela, quando chegava em casa e dizia: ‘Mãe, cheguei’. As lembranças das ligações, quando ela queria saber como eu estava. As lembranças de quando eu ligava para saber dela, preocupada. As lembranças de quando ela vinha comemorar meu aniversário… Tudo isso eu me lembro. Nada disso vai ser apagado da minha vida”, declarou. O julgamento Julgamento de acusado pela morte de Ana Caroline dura mais de 12 horas Elizeu Carvalho foi condenado a 27 anos e oito meses de prisão pelo feminícido de Ana Caroline Sousa Campelo, de 21 anos. O julgamento foi realizado nessa quarta, em Governador Nunes Freire . O crime aconteceu em dezembro de 2023, em Maranhãozinho, a 232 km de São Luís, e foi marcado por extrema violência. Segundo a denúncia, “Baiano” teria arrancado a pele do rosto, olhos, orelhas e parte do couro cabeludo de Ana Caroline. Imagens de câmera de segurança obtidas pelo g1 mostram a jovem voltando do trabalho de bicicleta quando foi seguida pelo réu, que estava em uma motocicleta (veja abaixo). Vídeo mostra jovem lésbica antes de ser assassinada Em depoimento à polícia, Elizeu confirmou ser o homem nas imagens pilotando a moto, mas negou envolvimento no crime. O Ministério Público afirmou que a motivação estava ligada à condição de sexo feminino da vítima, configurando o crime como feminicídio, o que foi reconhecido pelo Conselho de Sentença. A sessão do júri popular durou mais de 14 horas, começando às 8h e terminando às 22h30. O julgamento foi presidido pelo juiz Bruno Chaves de Oliveira, da 1ª Vara de Maracaçumé, que responde pela comarca. Nenhuma testemunha de defesa compareceu à sessão. Na sentença, o juiz classificou a culpabilidade como “elevadíssima” e destacou a brutalidade do crime. Apesar de ser réu primário, Elizeu demonstrou “personalidade fria, cruel e desprovida de empatia”, segundo o magistrado, que negou o direito de recorrer em liberdade. Elizeu Carvalho de Castro, conhecido como “Baiano”, foi condenado a 27 anos e oito meses de prisão Reprodução Relembre o caso O Ministério Público apontou na denúncia que, na madrugada de 10 de dezembro de 2023, Ana Caroline deixou seu local de trabalho por volta de 1h, retornando para sua casa. No caminho, a jovem passou a ser perseguida por um homem em uma motocicleta. Ana tinha 21 anos e, meses antes do crime, morava na cidade de Centro do Guilherme, mas se mudou para Maranhãozinho para morar com a namorada. Ministério Público diz que Elizeu Carvalho é o homem que aparece em um vídeo e que teria matado a jovem Ana Caroline. Ele nega. Divulgação/Polícia Civil De acordo com a Denúncia, assinada pelo promotor de justiça Felipe Boghosian Soares da Rocha, Ana Caroline teria sido morta com emprego de asfixia e meio cruel, mediante recurso que dificultou a defesa dela. O autor do crime foi identificado pela polícia como Elizeu Carvalho de Castro, conhecido como “Bahia” ou “Baiano”, de 32 anos. Ele teria abordado Ana a uma esquina da casa da vítima, em local deserto, onde a obrigou a subir na moto dele e a levou para uma estrada vicinal, em direção ao Povoado Cachimbo. Nesse povoado, Elizeu teria matado a jovem por asfixia. LEIA MAIS: O que se sabe sobre a morte de Ana Caroline Ainda de acordo com a denúncia, o crime foi praticado de forma cruel, pois Baiano teria arrancado a pele do rosto da vítima, olhos, orelhas e parte do couro cabeludo. Após o crime, Elizeu teria abandonado o corpo no local, que foi encontrado na manhã do mesmo dia. Elizeu de Castro foi preso em 31 de janeiro de 2024, em uma fazenda no município de Maranhãozinho. Ele negou a participação no assassinato e ficou calado nos interrogatórios. O corpo de Ana Caroline foi encontrado por familiares próximo à Rua Getúlio Vargas, a cerca de 300 metros da rua onde ela teria virado com sua bicicleta. Os parentes encontraram primeiro a bicicleta antes de achar seu corpo. Homem de camiseta branca passa pela rua e faz o mesmo trajeto de Ana Caroline. Reprodução Uma vizinha de Ana Caroline contou à polícia que, pouco antes de desaparecer, viu a jovem com um homem de camiseta branca em uma moto. A testemunha disse ter visto quando esse homem colocou Ana Caroline no veículo e partiu em direção a uma estrada vicinal, que dá acesso ao povoado Cachimbós, onde o corpo foi posteriormente encontrado. No dia 16 de fevereiro, a Perícia Oficial do Maranhão também exumou o corpo de Ana Caroline, após decisão da Justiça. Autora do pedido, a Polícia Civil alegou que o corpo foi enterrado sem nenhum exame criminalístico. O corpo da jovem estava enterrada em Centro do Guilherme (MA), cidade natal da vítima, e, com a decisão, os restos mortais foram levados para perícia em São Luís. Luta para criar o tipo penal 'lesbocídio' Advogada da família e assistente de acusação do MP, Luanna Lago afirma que o caso de Ana Caroline se trata de um crime de ódio cometido contra uma mulher lésbica, o que é chamado de lesbocídio. Segundo ela, o fato de o réu passar por um júri popular (quando a pessoa é julgada por outros cidadãos em vez de um juiz de carreira) pode ser representativo a depender da decisão que envolva o caso de Carol, como a mãe a chamava. "Quando essas pessoas compreendem a dinâmica do crime, a gravidade da situação e condenam esse indivíduo, a gente conclui que o povo não aceita mais que as mulheres, que as pessoas lésbicas sejam desumanizadas, sejam tratadas de forma monstruosa", afirma. Lago considera que uma eventual condenação fortalece a luta para que o lesbocídio vire um tipo penal, processo similar ao que ocorreu com o feminicídio. Caso a proposta avance, seria um crime que seria agravado da mesma forma que um assassinato de mulheres pelo fato de serem mulheres é enquadrado desta maneira. A luta é para reconhecer o homicídio de uma mulher pelo fato de ela ser lésbica. "É importante trazer essa visibilidade, mostrar porque nós existimos, que esses casos estão acontecendo aqui", afirma Ana a ativista Maria Esteves, integrante do Coletiva Lesbo Amazônidas, que critica a invisibilidade de crimes de ódio praticados contra mulheres que se relacionam com mulheres. "Precisamos ter cada vez mais do apoio do poder público, da segurança pública, da assistência social, para que reconheça a nossa existência para desenvolver prevenção, promoção de direitos e, principalmente, a reparação para a família e para os amigos", diz a psicóloga.